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sábado, 10 de junho de 2023

As gravações de José Taveira

Como ficou dito na entrada anterior deste blogue, José Taveira foi um cantor muito activo no meio académico portuense na primeira metade da década de 1920. Pelo final da década, gravou pelo menos dois discos como cantor, e colaborou como viola de acompanhamento em sete outros discos.

Como cantor, José Taveira gravou pelo menos os seguintes discos:

Fado Hilario / Fado da Sr.ª da Graça (Parlophon B. 33012)
José Taveira (c), acomp. Ernesto Brandão (g), Amândio Marques (g) e Paes da Silva (v)
Gravações disponíveis no Gallica (da Biblioteca Nacional de França) e no YouTube (v. abaixo).
[Sobre este disco, v. também o texto de António Nunes, «Velhas "frituras"», que revelou a sua existência. As transcrições das letras apresentadas abaixo foram copiadas desse texto.]

  •  Fado Hilario («A minha capa velhinha»)
  • Música: Augusto Hilário / Manassés de Lacerda (dois temas distintos de A. Hilário combinados num só, provavelmente por Manassés de Lacerda) / Letra: 1.ª e 2.ª quadras de Augusto Hilário, 3.ª de António Nobre

    A minha capa velhinha
    É da cor da noite escura;
    Quero nela amortalhar-me
    (Ai) Quando for p'ra sepultura.

    A minha capa ondulante
    (Ai) Feita de negro tecido;
    Não é capa de estudante
    (Ai) É mortalha d'um vencido.

    (Ai) Minha capa vos acoite
    Que é pr'a vos agasalhar;
    Se por fora é cor da noite
    Por dentro é cor do luar.
  •  Fado da Sr.ª da Graça [Um fado de Coimbra] («Nossa Senhora da Graça»)
  • Música: Paulo Correia de Sá / Letra: «popular»

    Nossa Senhora da Graça
    Que tantos milagres fazes
    'Stou de mal com meu amor
    Senhora fazei as pazes.

    Esse ar de santa a brilhar
    Que no teu rosto esvoaça
    Põe meus lábios a rezar
    Maria, cheia de graça.

Carta 9 de Abril (partes 1 e 2)
(Não sei o código do disco, nem tenho dados sobre os instrumentistas.)
Música e letra: Afonso Correia Leite [a letra cantada por José Taveira tem várias corruptelas]

    Ao escrever-te estas linhas
    Só chora o meu coração
    Porque as palavras são minhas
    Só as letras não são

    Nove d'Abril, meu amor,
    Triste data em que ditei
    [Tudo que de?] ti pensei
    Oh minha adorada flor!
    Bocados da minha dor,
    Fatalidades daninhas,
    Não pensas, não adivinhas (bis)
    O que eu sofro, minha querida.
    Estou entre a morte e a vida
    Ao escrever-te estas linhas.

    Numa horrorosa batalha
    No fim de grande cansaço
    Fui ferido, perdi um braço
    Numa chuva de metralha
    Pois se a nossa esperança falha
    Por acaso ou maldição
    Pois já nem possuo a mão (bis)
    Pra te dar em casamento.
    Que dor, estremecimento(?)
    Só chora o meu coração

    Olha, leva a minha mãe
    Muitos beijos e carícias,
    Diz que de mim tens notícias,
    Que sou vivo e que estou bem.
    Depois engana, também,
    Minhas pobres irmãzinhas,
    Inocentes, coitadinhas,
    Que sentem, como tu sentes (bis)
    Dize, não és tu que mentes
    Porque as palavras são minhas

    E enquanto a mim, desvanece
    Arranja outro namorado,
    Porque um pobre mutilado
    Futuro algum te oferece.
    Todo o nosso amor esquece
    Deixa pra mim a paixão
    E guarda em recordação
    Esta última cartinha (bis)
    Junto às outras porque é minha
    Só as letras o não são.


Como viola, José Taveira participou pelo menos nas seguintes gravações (a maior parte das quais já referida em Gravações de estudantes do Porto dos anos 1920 no Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado):

I - Pais da Silva (v)
acomp. José Taveira (v)
Um disco e uma faixa de outro disponíveis em: Pais da Silva - Arquivo Sonoro Digital

Pas de Quatre
(Autor desconhecido - «popular»)

Padre Nuestro
(Enrique Delfino)

Amanhecendo
Tango (Pais da Silva)

II - Ernesto Brandão (g)
acomp. José Taveira (v)
Dois discos (quatro faixas)

Fado em sol maior (disponível em: Ernesto Brandão - Arquivo Sonoro Digital)
(Autor desconhecido - «popular»)

Fado em ré menor (disponível em: Ernesto Brandão - Arquivo Sonoro Digital)
(Autor desconhecido - «popular»)

Fado em lá maior (Parlophon B. 33007-I)
(Autor desconhecido - «popular»)

Fado em lá menor (Parlophon B. 33007-II)
(Autor desconhecido - «popular»)

III - Manuel R. Pereira Leite (g) e José Taveira (v)
Três discos (seis faixas), gravados em finais de 1928 ou início de 1929, disponíveis em: Manuel R. Pereira Leite, José Taveira - Arquivo Sonoro Digital (atenção: a primeira das duas gravações identificadas aí como «Fado Pinto Ribeiro (fá sustenido menor)» é na verdade «Fado Pinto Ribeiro (dó sustenido menor)», como se pode ler na etiqueta do disco)

Fado João de Deus (Variações) 1.ª parte
(João de Deus, filho - tema original)

Fado João de Deus (Variações) 2.ª parte
(João de Deus, filho - tema original)

Fado Pinto Ribeiro (dó sustenido menor)
(Aires Pinto Ribeiro)

Fado Magiolo
(Magiolo, Magiolly, Maggyoli, Maggiolli,...?)

Fado Pinto Ribeiro (fá sustenido menor)
(Aires Pinto Ribeiro)

Fandango Mirandês
(Manuel R. Pereira Leite)

domingo, 28 de maio de 2023

Viamonte e José Taveira, dois cantores de fados da primeira metade da década de 1920

Na segunda metade da década de 1920 o grande cantor académico do Porto era Carlos Leal (v. Carlos Leal «O Rouxinol do Ave», "Tempos da fadistação...", Registos fonográficos de Carlos Leal e Amândio Marques e Gravações de estudantes do Porto dos anos 1920 no Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado).

Mas no início dessa década, quando Carlos Leal já andava em serenatas mas era ainda estudante do liceu, as estrelas eram outras.
No Porto Académico de 28/05/1923, p. 3, pode ler-se: "Haverá algum estudante que não saiba que Viamonte e Taveira são os azes (seja-me permitida a palavra?!) do fado entre o nosso meio? Parece-me que não!".

Esse cantor Viamonte, que também é referido nos textos de Carlos Leal e Amândio Marques (neste caso como "Viemonte", por gralha), seria certamente Francisco Viamonte de Sousa da Silveira (1897-1963), que também usou o nome Francisco Leite Correia de Almada de Viamonte da Silveira e era filho de José Viamonte de Sousa da Silveira, Visconde de Viamonte da Silveira. Esteve matriculado na Universidade de Coimbra (em Matemática?) entre 1915 e 1919. Neste ano transferiu-se para a Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, inscrevendo-se nas cadeiras que lhe faltavam para completar os Preparatórios de Engenharia; depois ter-se-á inscrito na então chamada Faculdade Técnica da UP, pois viria a ser engenheiro civil.
Em maio de 1922 participou na digressão do Orfeão e da Tuna a Espanha, na qual os espetáculos terminavam com «Guitarradas e Fados pelos estudantes Aires Pinto Ribeiro, Aurélio Fernandes, Ernesto Cardoso e Viamonte» (Programa das festas a realizar em Espanha). Em 1923 participou numa excursão (com espectáculos) do 4.º ano de Medicina pelo sul do país, cantando fados acompanhado por Milheiro (Porto Académico, 09/04/1923, p. 4) e colaborou numa festa em benefício do Asilo de S. João, cantando fados (Porto Académico, 07/05/1923, p. 2).
Segundo a Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira (vol. 34, verbete "Viamonte da Silveira (Viscondes de)") casou-se em 1925, e é natural que nessa altura já tivesse concluído o curso. Seja como for, não conheço qualquer referência à sua participação em actividades académicas depois dessa data.

Quanto a Taveira, trata-se de José dos Santos da Silva Taveira, nascido em 3 de Junho de 1901 em Goujoim, Armamar, filho de Francisco da Silva Taveira.
Inscreveu-se na FCUP em Outubro de 1921, provavelmente com vista a fazer os Preparatórios de Engenharia Civil, Mecânica, ou Electrotécnica; mas na FCUP não parece ter tido aprovação em mais do que três disciplinas (Química - curso geral, Desenho Rigoroso e Desenho Topográfico), nos anos lectivos 1921/22 e 1922/23 [Livro de registos de inscrições e exames dos alunos da Faculdade de Ciências (Nº 23)].
No início e meados da década de 1920, José Taveira foi muito activo como cantor de fados. Nos números do Porto Académico de 1923 e 1924 há várias referências a actuações suas em espectáculos, quer integrados em excursões de alunos da Faculdade de Ciências ou da Tuna quer na recepção à Tuna de Madrid que visitou o Porto; por exemplo, na excursão da Tuna a Vila Real, «os fados e as guitarradas pelo Taveira[,] Brandão, Cicero e Delgado agradaram bastante e foram bisadas» (Porto Académico, 28/05/1923, p. 1). O guitarrista que mais frequentemente acompanhava José Taveira era Ernesto Brandão, também da Faculdade de Ciências.
A partir de Abril ou Maio de 1924, José Taveira dividiu o palco com Carlos Leal: num espectáculo da Tuna em Viana por essa altura, «os fados pelos Drs. Aires e Aurelio Fernandes e por Taveira e Leal fizeram vibrar intensamente numa emoção forte a todos os que tiveram o prazer grande de ouvi-los» (Porto Académico, 05/05/1924, p. 3). Segundo Amândio Marques, «José Taveira e Carlos Leal, eram os solistas admiráveis [...] pela sua voz melodiosa, forte, encantadora e sentimental, do Orfeão e da Tuna. E eram, também, os cantores dos lindíssimos fados de então». Para além das actuações em palco, tanto Amândio Marques quanto Carlos Leal apontam José Taveira como participante habitual em serenatas. No entanto, é bastante claro que Carlos Leal rapidamente assumiu o primeiro plano. Foi logo em 1924 que o regente da Tuna Modesto Osório compôs para o jovem tenor a música «A Tua Serenata».
Depois do seu parco sucesso académico na Faculdade de Ciências, José Taveira deve ter-se inscrito no Instituto Superior de Comércio do Porto no curso superior consular que lá funcionava. O Anuário Diplomático e Consular Português de 1966 diz que era «licenciado em Ciências Económicas e Financeiras», o que deve ser uma referência a ter feito algum curso nesse Instituto. [Tentando explicar: o Instituto Superior de Comércio do Porto foi criado em 1918, à imagem e com estrutura exactamente igual à do Instituto Superior de Comércio de Lisboa, que já existia desde o início da República; estes dois institutos ofereciam, entre outros, o curso superior consular; em 1930, o Instituto Superior de Comércio de Lisboa passou a chamar-se Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras (ISCEF) e foi um dos institutos fundadores da Universidade Técnica de Lisboa; em 1933, foi extinto o Instituto Superior de Comércio do Porto, funcionando transitoriamente até 1936 para os alunos já inscritos poderem terminar os seus cursos; durante esse período transitório, foi utilizado o nome Instituto Superior de Ciências Económicas e Financeiras do Porto - v., p. ex. «A "Festa da Pasta" no Instituto Superior de Ciencias Económicas e Financeiras», Commercio do Porto, 21/05/1935, p. 6.]
Pelo final da década, José Taveira gravou vários discos, quer como cantor quer acompanhando antigos colegas à viola (a próxima entrada deste blogue será sobre essas gravações). Em Maio de 1929 estavam para ser postos à venda os discos em que acompanhava o guitarrista Manuel Pereira Leite, mas num espectáculo em que este tocou as mesmas músicas, o acompanhamento à viola coube a Pais da Silva («Festa de caridade no Theatro S. João», O Commercio do Porto, 05/05/1929, p. 2) - o que pode indicar que José Taveira estaria já, possivelmente, a desligar-se da vida académica e musical.
Em Fevereiro de 1930, José Taveira entrou para o quadro diplomático e consular. Foi cônsul, entre outros sítios, em S. Paulo (1934-1935), México (1941-1945) e Banguecoque (1953-1955). Terminou a carreira em Lima (Peru), como encarregado de negócios (1961-1964) e embaixador (1964-1966).
O n.º único de 1962 do Porto Académico também inclui um texto seu sobre os tempos de estudante no Porto, («Mira, mira! Son los mismos!...», p. 24) assinado por «José Taveira - Cônsul de Portugal em Lima (Peru)». Curiosamente, em vez de se focar em glórias como solista da Tuna e Orfeão, serenateiro ou cantor com discos gravados, esse texto centra-se na história da excursão do 3.º ano de Ciências à Galiza em 1923, que tinha sido um fracasso - a um público que esperaria uma tuna, os excursionistas apresentavam fados e guitarradas e uma comédia em português, com piadas que a assistência não compreendia.
José Taveira morreu em Abril de 1967, em Lisboa (Diário de Lisboa, 04/04/1967, p. 17).

Agradeço a Manuel Marques Inácio a ajuda na biografia de José Taveira.

quinta-feira, 13 de abril de 2023

Os discos e as partituras de Manassés de Lacerda

[Entrada actualizada em 22/04/2023. A mudança mais relevante é a inclusão das imagens das partituras.]

Como já foi dito neste blogue, em Manassés de Lacerda e a sua passagem pelo Porto, Manassés de Lacerda gravou vários discos, no Porto, por volta de 1905-1906.

O ano certo em que foram feitas as gravações não é conhecido, e tanto quanto sei não é impossível que datem de 1904, na sequência do êxito de Manassés na digressão da Tuna Académica da Universidade de Coimbra pelo norte do país. Mas a edição de partituras dos seus fados por Artur Barbedo, com clara associação aos discos, pode ser datada de 1906, como veremos abaixo. Assim, parece-me mais provável que as gravações tenham sido feitas em 1905 e/ou 1906.

Apesar de terem tido grande sucesso na sua época, os discos de Manassés de Lacerda vieram a cair no esquecimento, eclipsados pelos sucessos ainda maiores de cantores como António Menano na década de 1920. Em 2006, conhecedores tão profundos da história da música de Coimbra como José Anjos de Carvalho e António Nunes ouviam pela primeira vez uma gravação de Manassés: http://guitarradecoimbra.blogspot.com/2006/10/fado-maria-rosto-do-disco-de-78-rpm.html.
Actualmente a situação é diferente, já que doze dessas gravações estão disponíveis para audição no Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado, digitalizadas a partir de discos da colecção Bastin.
É necessário, no entanto, ter algum cuidado porque, infelizmente, os responsáveis do Arquivo não distinguiram Manassés de Lacerda do "tenor Lacerda", um cantor que se terá aproveitado da popularidade do primeiro para vender discos na década de 1910. Isto é: nem todas as gravações identificadas no Arquivo como sendo de Manassés de Lacerda são do próprio. No entanto, a leitura das etiquetas dos discos, bem como a audição das gravações, permite facilmente fazer esta distinção.

Vejamos então as gravações disponíveis, genuínas, de Manassés de Lacerda, notando que há duas séries de discos, comercializados por editoras distintas.


(Etiqueta do disco Beka 7314, imagem retirada de Repertório de Manassés de Lacerda (1).)

Para a editora alemã Beka, Manassés gravou com acompanhamento de guitarra os seguintes discos, disponíveis em https://arquivosonoro.museudofado.pt/interprete/189/manasses-de-lacerda (facilmente reconhecíveis pela etiqueta amarela):

Canção da Encosta
(Beka 7316)

Fado Corrido
(Beka 7318)

Fado das Ruas
(Beka 7314)
[Sobre este tema, v. Repertório de Manassés de Lacerda (1)]

Fado do Porto
(Beka 7374)

Fado do Povo
(Beka 7319)

Fado Hilario
(Beka 7373)

Fado Serenata
(Beka 7320)


Para a Gramophone Co. (e/ou para a Zonophone, que era uma filial da Gramophone), Manassés gravou com acompanhamento de piano os seguintes discos, disponíveis em https://arquivosonoro.museudofado.pt/interprete/189/manasses-de-lacerda:

Fado Amoroso
(disponível em duas cópias, G.C.3-62293 (?) com etiqueta cor de vinho e G.C.-62382 com etiqueta preta)

Fado das Lágrimas
(disponível em duas cópias, G.C.3-62292 (?) com etiqueta cor de vinho e G.C.-62385 com etiqueta preta)
[Sobre este tema, v. Fado das Lágrimas e Fado das Lágrimas]

Fado dos Sonhos
(disponível em duas cópias, G.C.3-62296 (?) com etiqueta cor de vinho e G.C.-62386 com etiqueta preta)

Fado Hilario
(disponível em duas cópias, Gra.3-62297 (?) com etiqueta cor de vinho e G.C.-62384 com etiqueta preta)

Fado Maria
(Zo. X-52063)

Reforço que as restantes gravações disponíveis em https://arquivosonoro.museudofado.pt/interprete/189/manasses-de-lacerda (Fado Ciumento, Fado da Pálida madrugada com variações de flauta, Fado das Salas, Fado Lisboa e Maria Paula) não são de Manassés de Lacerda, e sim do "tenor Lacerda".


Paralelamente, o comerciante de gramofones portuense Artur Barbedo editou duas ou três séries de partituras de Fados e canções portuguezas cantadas por Manassés de Lacerda, para cylindros e discos de machinas fallantes; Porto: Litographia Portugueza. As brochuras não aparecem datadas, mas a 1.ª série deu entrada na Biblioteca Nacional de Lisboa em Março de 1906, e a 2.ª em Maio do mesmo ano [Boletim das Bibliothecas e Archivos Nacionaes, 5.º ano (1906), p. 102 e 200]; a 3.ª série parece não ter chegado a ser depositada na BN.

Se a capa indicava que as partituras eram de temas gravados por Manassés, a contracapa reforçava a associação: Artur Barbedo não só vendia discos e gramofones, como os reparava e tinha mesmo um "atelier d'enregistrar". Terá sido aí, no 1.º andar do n.º 310 da Rua Mouzinho da Silveira, que Manassés de Lacerda gravou os seus discos?

No entanto, note-se que a correspondência entre os discos e as partituras não é perfeita: dos 30 temas com direito a partitura, apenas 10 aparecem nos discos referidos acima (mas é possível que a colecção Bastin não incluísse todos os discos gravados por Manassés); um dos fados gravados por Manassés não parece constar em nenhuma das séries (Fado do Povo, Beka 7319, talvez o mais «afadistado»; a letra aparece como «Pregões de Lisboa» em Alberto Pimentel, A triste canção do sul, 1904, 110-112); alguns temas têm títulos diferentes (e há mais algumas pequenas diferenças).

A partir de 1914 as três séries tiveram reedições por parte de uma editora portuense especializada em música impressa, a Casa Moreira de Sá. A capa das brochuras mantinha-se, mas sem referências a discos nem gramofones. António Nunes mostrou que pelo menos uma dessas reedições é de 1920 ou posterior; além disso, as séries editadas por Moreira de Sá tiveram também distribuição no Brasil [Repertório de Manassés de Lacerda (1)]. Conheço ainda um exemplar da 5.ª edição da 3.ª série, que foi oferecida à Associação Académica do Porto em 1925 por José Belchior Júnior (o qual era autor de várias músicas, incluindo um fox-trot "Capa e Batina", publicadas pela Casa Eduardo da Fonseca, mas isso será outra história).

Os temas constantes de cada uma das três séries são os seguintes:

1.ª Serie

Fado das ruas («Oh pallida madrugada») [disco Beka 7314]

Fado amante («Eu hei-de ir ao cemiterio»)

Fado da saudade («Sumia-se a barca, eu chorava»)

Canção da encosta («Quando subo pela encosta») [disco Beka 7316]

Fado amoroso («Meu canto ao vento fluctua») [disco G.C.3-62293 / G.C.-62382]

Fado de Coimbra («A lua, pastor bendito»)

Fado da briza («A brisa dizia á rosa»)

Fado Maria («Maria tu és na terra») [disco Zonophone X-52063]

Fado das lagrimas («Oh! fonte que estás chorando») [disco G.C.3-62292 / G.C.-62385]

Fado serenata («Ai que martyrio não visto») [apesar de um dos discos acima ter o título «Fado serenata», não se trata deste tema; v. abaixo Fado Bohemio]

2.ª Serie

Fado Hylario Moderno («Eu quero que o meu caixão») [discos Beka 7373 e G.C.3-62297 / G.C.-62384, em ambos como Fado Hilario]

Fado Nocturno («Na noite calada e erma»)

Fado Ideal («Morena teus olhos bellos»)

Fado das Rosas («Deixas-me óh; formoza pomba») [disco G.C.3-62296 / G.C.-62386, como Fado dos Sonhos]

Fado Corrido, 1.º («Meu doce fado és tão triste») [disco Beka 7318, como Fado Corrido]

Fado Primavera («Cantarei na despedida»)

Talvez te escreva («Talvez te escreva se as saudades»)

Fado de Monte-mór («Tu não vês meu amorzinho»)

Fado Estoril («Á beira d'alvo regato»)

Fado Brejeiro («Anda o sol a mal com a lua»)

3.ª Serie

Fado corrido 2.º («Amor é sonho que mata»)

Adeus-Canção («A ti, que em astros desenhei nos ceus»)

Fado Bohemio («Não chores violão, não chores») [disco Beka 7320, como Fado Serenata]

Fado de Lisboa («Passarinhos, meus amigos»)

O meu fado («Na minha campa desfolha»)

Fado de Guimarães («A trança que tu me déste»)

Fado triste («Envolto nos teus cabelos»)

Fado da Minha Terra («Das lagrimas faço contas»)

Fado do Porto («Ouvi dizer de amor louco»)

Serenata d'Amor («Acorda, á janela, vem manso e de leve»)

(As partituras da 3.ª séries foram digitalizadas a partir de fotocópias que me foram cedidas pelo dr. Carlos Teixeira, há mais de 25 anos.)

Manassés de Lacerda e a sua passagem pelo Porto

O nome de Manassés de Lacerda é conhecido hoje em dia (quando o é) principalmente através do Fado Manassés, um clássico do repertório do Fado de Coimbra.
(Diga-se, a propósito, que o próprio cantava e gravou essa composição com o nome "Fado Maria" e uma letra distinta das com que é cantado actualmente; e que mesmo essa versão era uma adaptação do Fado Mont'Estoril de Reynaldo Varella, que tinha ainda outras letras: v. O mesmo autor, a mesma música, vários títulos e Fado Monte Estoril - Reynaldo Varella.)
É também provável que tenha sido Manassés quem juntou e adaptou dois temas de Augusto Hilário, dando origem ao Fado Hylario Moderno que é (quase) o que hoje conhecemos como Fado Hilário; v. Anjos de Carvalho e Murta Rebelo, Evocação de Hylário na Coimbra do seu tempo - origem e evolução do chamado Fado Hilário, Sociedade Histórica da Independência de Portugal, 1998.

No entanto, para além de uma ou outra composição, Manassés de Lacerda é um nome importantíssimo na afirmação do género musical geralmente conhecido como Fado de Coimbra. No mínimo, poderemos dizer que se trata do primeiro cultor deste género, oriundo do meio académico, a gravar discos com grande sucesso. Este sucesso pode ser avaliado pelos factos de nos anos seguintes o tenor António Ferreira ter gravado, no Porto, alguns discos com a indicação expressa "stylo Manassés de Lacerda" e de um outro cantor, em Lisboa, ter gravado algumas das composições celebrizadas por Manassés, apresentando-se simplesmente como "tenor Lacerda" (para enganar compradores incautos?). Na verdade, embora o "estilo Manassés de Lacerda" tenha sido depois ultrapassado, constitui provavelmente uma etapa fundamental na constituição do Fado de Coimbra como género musical reconhecível. Sobre o "estilo Manassés", v. também o texto de António M. Nunes sobre o Fado Maria em http://guitarradecoimbra.blogspot.com/2006/10/fado-maria-rosto-do-disco-de-78-rpm.html.

Quanto a dados biográficos, importa ressaltar que foi o antigo estudante de Coimbra brasileiro Divaldo Gaspar de Freitas quem primeiro recolheu elementos que lhe permitiram escrever um resumo biográfico de Manassés: Divaldo Gaspar de Freitas, Emudecem Rouxinois do Mondego, São Paulo, 1972, p. 111-119. Aqui tentarei acrescentar alguns pormenores, particularmente relativos à sua passagem pelo Porto.

Manassés Ferreira de Lacerda Botelho nasceu em Sabrosa, Trás-os-Montes, em 1885. Frequentou o Liceu de Coimbra de 1900 a 1904, mas não terminou o ensino secundário. Em Coimbra tornou-se famoso como cantor.
Num texto datado de 1904, Herlandér Ribeiro descrevia assim as serenatas dominadas por Manassés:
"As novidades para mim, que sou lisboeta: as serenatas que passam á porta, grupos de estudantes, o Manacés a cantar o fado, ao violino o Francisco Pereira e Mauricio Costa, á guitarra Adelino Sá e Manoel Alegre, com ferrinhos o Graça, de Loanda e, de viola a tiracolo, o Adelino Figueira, têem na verdade, um aspecto de orquestra agradável. Manacés canta lindamente o fado, e pelas noites tranquilas de Coimbra-alta, este conjunto de voz e instrumentos chama todos ás janelas, e atraz da serenata vão centenas de pessoas, que se apertam nestas ruas de pouco mais de um metro de largura, como são as do Loureiro e Arco do Bispo." [Herlandér Ribeiro, Cartas de uma tricana, Lisboa: edição fora do mercado, 1936, p. 119-120]
Em 1903-1904 integra a Tuna Académica da Universidade de Coimbra (tal como outros cinco estudantes do Liceu) e sobressai numa digressão pelo norte do país. Segundo um jornal da Póvoa de Varzim, "O melhor da noite foi, sem dúvida, a voz trinada e maviosa de Manassés, o émulo distintíssimo das serenatas de Coimbra, o retinto e adorável sucessor do chorado Hylario" [António José Silva Nascimento e José António Silva Nascimento, Sobre a Tuna Académica da Universidade de Coimbra, 1888-1913, 2.ª ed., 2013, p. 193].

No ano lectivo 1904-1905, Manassés transfere-se para o Colégio S. Carlos, situado na rua Fernandes Tomás, no Porto, mas continua a cantar: segundo o seu condiscípulo Fernando de Sá Moreira, "ali, costumava vir para a rua cantar fados, com a sua bem timbrada e extensa voz, com a característica de notas expressivamente prolongadas" [Divaldo Gaspar de Freitas, Emudecem..., p. 115-116].
Ainda nesse ano lectivo, Manassés participa em espectáculos com a Tuna Académica do Porto. Em 16 de Março de 1905, houve um sarau organizado pelo Grupo Académico do Porto "a favor dum estudante pobre", no Teatro Príncipe Real (actual Teatro Sá da Bandeira). Segundo Ernesto Varzea, que consultou o programa, a seguir à abertura pela Tuna seguiam-se "fados cantados pelo académico Manassés de Lacerda, acompanhado à guitarra e violas pelos académicos Moniz e Casimiro Barbosa (o antigo director dos Correios Canto Moniz, pai do clínico do mesmo nome, e o ilustre professor Raúl Casimiro)". No mesmo sarau, Manassés participou ainda numa farsa e recitou um monólogo. [O Tripeiro, V série, vol. 1, p. 21]
Nove dias depois, a Tuna foi a Aveiro promover um sarau "a favor da fundação de uma bibliotheca gratuita para estudantes pobres", com um programa muito semelhante. Mais uma vez, incluía "Fados, cantados por Manassés de Lacerda" [Campeão das Províncias, 25/03/1905, p. 2].

Um parêntesis sobre os acompanhadores de Manassés de Lacerda no Porto:
António Borges do Canto Moniz Júnior (Graciosa, 12/09/1883 - ?, 09/03/1949) era filho do inspector dos impostos, professor, literato e tocador de banza amador António Borges do Canto Moniz (Angra do Heroísmo, 27/02/1846 - Porto, c. 1916). [Acrescentado em 24/05/2023: no ano lectivo 1904-1905 estava matriculado no Instituto Industrial e Comercial do Porto, no curso superior de Comércio.] Foi responsável pelos Correios do Porto entre 1921 e 1927, e mais tarde director dos CTT do Ribatejo. Mais interessante: era pai do cirurgião Luís Canto Moniz, um dos melhores amigos de Carlos Leal, o mais importante cantor de fados da academia do Porto nos anos 1920 (v. as referências a Canto Moniz em Carlos Leal «O Rouxinol do Ave»).
Raul Casimiro Barbosa (Régua, 23/04/1885 - ?, 1963) estudou no Liceu Central do Porto e no Instituto Industrial e Comercial do Porto [acrescentado em 24/05/2023: esteve inscrito neste Instituto de 1900 a 1907, em vários cursos]. Trabalhou nos Caminhos de Ferro, mas destacou-se na música: foi um dos fundadores e primeiro director artístico do Orfeão do Porto, maestro de diversos outros coros, professor de canto coral (nomeadamente no Conservatório de Música do Porto), compositor de música para coro e impulsionador do orfeonismo. V. https://anossamusica.web.ua.pt/esprofile.php?esid=909.

Por volta de 1905-1906, Manassés gravou diversos discos, no Porto, para duas editoras distintas: Beka e Gramophone/Zonophone. Em paralelo, o editor portuense Artur Barbedo editou três séries de partituras de fados e canções cantados por Manassés (com a indicação "para cylindros e discos de machinas fallantes"). Já acima se referiu o sucesso (para a época) desses discos. As partituras tiveram várias reedições, pela também portuense Casa Moreira de Sá, até cerca de 1920.
Uma próxima entrada neste blogue dará mais pormenores sobre estes discos e partituras.

Manassés de Lacerda casou-se no Porto em 1908 e, segundo Divaldo Gaspar de Freitas, "nesse mesmo ano" o casal emigrou para o Brasil. Durante muito tempo pensei que "nesse mesmo ano" pudesse ser um mal-entendido: poderiam ter partido, por exemplo, menos de um ano depois de terem casado. Isto porque um texto memorialístico publicado no n.º único de 1962 do Porto Académico sugeria que Manassés teria participado na digressão que a Tuna Académica do Porto fez em Fevereiro de 1909 à Galiza. No entanto, tal não aconteceu: segundo o jornal El Noroeste, da Corunha, o espectáculo da Tuna incluía guitarradas e fados, mas "cantados por los estudiantes Mario y Alvaro Costa y Catao Limoés" (descontadas gralhas e dificuldades com transcrição de nomes portugueses, deve tratar-se da formação constituída pelos irmãos Mário e Álvaro Barreto Costa e por Catão Simões Júnior, que estava activa ainda em 1912, na altura da fundação do Orfeão Académico do Porto).

No Brasil, pelo menos numa primeira fase, Manassés manteve actividade artística [Uma tournée de Manassés de Lacerda no Brasil (1915)].
Em 1917, regressou a Portugal, mas voltou definitivamente ao Brasil em 1919.
A partir daí, parece ter ido caindo no esquecimento. Nos últimos anos de vida convivia apenas com a família e meia dúzia de amigos, recusando alguns convites para reuniões de antigos estudantes de Coimbra no Brasil.
Morreu no Rio de Janeiro, em 18 de Maio de 1962.

[24/05/2023: Agradeço ao Museu do ISEP o acesso aos livros de matrículas do Instituto Industrial e Comercial e a preparação prévia da informação.]

terça-feira, 6 de julho de 2021

Um «guitarrista exímio» esquecido: Aires Pinto Ribeiro


No seu texto memorialístico Carlos Leal «O Rouxinol do Ave», Amândio Marques enumera como guitarristas dos seus tempos de estudante no Porto «Aires Pinto Ribeiro, guitarrista exímio, Ernesto Brandão, Cícero de Azevedo, Manuel Pereira Leite e, dos mais modestos, o autor desta recordação». A sua auto-caracterização como «dos mais modestos» entende-se facilmente como modéstia retórica. Mas o realce a Aires Pinto Ribeiro, «guitarrista exímio», levanta as questões de saber quem era, e porque mereceu essa menção diferenciada.
Uma possível explicação parcial tem a ver com a diferença de idades entre Aires Pinto Ribeiro e Amândio Marques - uma diferença de quatro anos que é muito relevante se nos concentrarmos na faixa etária dos 15-24 anos. Pinto Ribeiro nasceu em 1899 e entrou para a Universidade do Porto em 1917, tendo ido para Moçambique em 1925; Amândio Marques nasceu em 1903 e teve intensa atividade como guitarrista no Porto enquanto ainda aluno do Liceu Rodrigues de Freitas, quando Aires Pinto Ribeiro já era estudante universitário. Não custa imaginar uma relação mentor/discípulo entre os dois, que teria ficado na memória de Amândio Marques, sem possibilidade de evolução para uma relação mais igualitária devido à ausência de Pinto Ribeiro a partir de 1925.
No entanto, há algo mais: alguns temas de Aires Pinto Ribeiro foram gravados no final dos anos 1920 por Amândio Marques, por Pereira Leite e, num caso, pelo excelente guitarrista não-académico António Coelho, conhecido como Barbeirinho (sobre os Barbeirinhos, v. Sobre os guitarristas "Barbeirinhos", do Porto). Se as gravações por estudantes mais novos parecem naturais, a gravação pelo Barbeirinho sugere uma reputação mais alargada de bom guitarrista, e provavelmente merecida.

Vejamos então as gravações de temas de Aires Pinto Ribeiro disponíveis no Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado.

Capricho
gravações disponíveis em https://arquivosonoro.museudofado.pt/repertorios?search=capricho
- versão de Amândio Marques (guitarra), acompanhado por Francisco Fernandes (2.ª guitarra) e José Pais da Silva (viola);
- versão do Trio de Guitarras e Viola, composto por António Coelho (Barbeirinho), António Martins e Augusto Nogueira.

Fado em dó sustenido menor
- versão de Amândio Marques (guitarra), acompanhado por Francisco Fernandes (2.ª guitarra) e José Pais da Silva (viola); disponível em https://arquivosonoro.museudofado.pt/repertorios?search=do+sustenido+menor;
- versão de Manuel R. Pereira Leite (guitarra), acompanhado por José Taveira (viola); disponível em https://arquivosonoro.museudofado.pt/repertorios?search=Pinto+Ribeiro (primeira faixa, identificada erradamente como «fá sustenido menor»).

Fado em fá sustenido menor
- versão de Manuel R. Pereira Leite (guitarra), acompanhado por José Taveira (viola); disponível em https://arquivosonoro.museudofado.pt/repertorios?search=Pinto+Ribeiro (segunda faixa).

Sobre a vida de Aires Pinto Ribeiro, a fonte principal é uma biografia/elogio póstumo, com o título Dr. Aires Pinto Ribeiro, da autoria do Brigadeiro Vasco da Gama Fernandes e publicada em 1960 por Sopime Edições. Seguem-se os três primeiros parágrafos desse texto, que são os que mais nos interessam aqui:

«Nasceu o Dr. Aires Pinto Ribeiro no lugar de Vila Nova, freguesia de S. Cipriano, concelho de Resende, às quatro horas da manhã do dia 12 do mês de Setembro de 1899. Foram seus pais Francisco Pinto Ribeiro e D. Sílvia Augusta, de profissão comerciantes.
Decorreu a sua meninice na aldeia natal, entre a contemplação dos verdes horizontes, os estudos primários e o cultivo incipiente da música a que era naturalmente inclinado. Aos 9 anos, o orgulho paterno levou-o a participar numa sessão pública, dedilhando, com significativo agrado, uma viola.
Vieram depois o liceu e a Faculdade de Medicina cursados no Porto. Dele se pode dizer, adaptando uma frase coimbrã, que não faz dano a música aos doutores. Mantendo-se estudante sempre aplicado, deixou fama a sua guitarra, gemendo pelas ruelas do velho burgo, em serenatas que ainda recordam com saudade os velhos companheiros das noitadas boémias, que ficaram famosas na academia portuense.»

Podemos acrescentar, com base no Anuário da FCUP de 1914-15 a 1917-18, que Aires Pinto Ribeiro se inscreveu no curso FQN (preparatório para Medicina) em 1917-18. O Anuário da FMUP de 1919-20 a 1926-27 diz-nos que se formou em 1923, informação complementada pelo Brigadeiro Vasco da Gama Fernandes: «a sua formatura concluiu-se no dia 25 de Novembro de 1923, com a honrosa classificação de 16 valores».
Dois pormenores: na digressão de maio de 1922 do Orfeão Académico do Porto (e também da Tuna) a Espanha, os espetáculos terminavam com «Guitarradas e Fados pelos estudantes Aires Pinto Ribeiro, Aurélio Fernandes, Ernesto Cardoso e Viamonte» (Programa das festas a realizar em Espanha); no seu último ano na Universidade do Porto, Aires Pinto Ribeiro foi eleito para o Conselho Fiscal da Associação dos Estudantes do Porto (Porto Académico, 12/03/1923, p. 3).
[24/05/2023, mais duas referências: numa récita do Orfeão Académico em Vila do Conde em 1923, «Aires, o guitarrista já agora consagrado, arrebatou o público» (Porto Académico, 07/05/1923, p. 3); no ano seguinte, já formado, ainda participou pelo menos num espectáculo da Tuna em Viana: «os fados pelos Drs. Aires e Aurelio Fernandes e por Taveira e Leal fizeram vibrar intensamente numa emoção forte a todos os que tiveram o prazer grande de ouvi-los» (Porto Académico, 05/05/1924, p. 3).]
Depois de cursar a Escola de Medicina Tropical (Lisboa), partiu para Moçambique, aonde chegou em 30 de março de 1925. Fez boa parte da sua carreira em Moçambique, como médico e, a partir de 1942, diretor dos Serviços de Saúde da colónia. Parece ter prestado grande atenção à população nativa (pelo menos para os padrões da época), em particular criando «postos sanitários móveis», com enfermeiros nativos, de forma a chegar às povoações rurais. Em 1948 foi transferido para Macau, também como director dos Serviços de Saúde locais. Em 1950 foi nomeado vice-presidente do Conselho do Governo de Macau, tendo ficado encarregado do Governo por alguns meses em 1951 (sobre alguns momentos da sua estada em Macau, v. https://nenotavaiconta.wordpress.com/tag/aires-pinto-ribeiro/). Deve ter voltado para Portugal (Lisboa) em 1954, quando se tornou Inspetor Superior dos Serviços de Saúde do Ultramar. Estando doente já há vários anos, morreu em 4 de março de 1960, em Lisboa.
(Fotografia retirada do livro do Brigadeiro Vasco da Gama Fernandes, Dr. Aires Pinto Ribeiro, Sopime Edições, 1960)

Ao longo dos anos em Moçambique e Macau passou temporadas de férias (ou de repouso por motivos de saúde) em Resende e no Porto, mas não há indícios de que tenha mantido o cultivo da guitarra.

Entre 1926 e 1930 houve uma grande vaga de gravações comerciais de música portuguesa, incluindo fados de Coimbra e incluindo músicos do meio académico portuense (v. Gravações de estudantes do Porto dos anos 1920 no Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado). Ausente em Moçambique, Aires Pinto Ribeiro falhou essa vaga de gravações. Se Amândio Marques, que gravou e escreveu no Porto Académico de 1962, foi caracterizado por Anjos de Carvalho e António Nunes como «[em 2006] um guitarrista totalmente esquecido», que dizer de Aires Pinto Ribeiro? Ficam três das suas composições, gravadas por outros, para recordarmos um guitarrista célebre na Academia do Porto do seu tempo.

sábado, 22 de maio de 2021

Gravações de estudantes do Porto dos anos 1920 no Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado

Já há alguns anos (mais precisamente, em 2016) foi disponibilizado online um arquivo da maior importância para a memória académica do Porto (e, na verdade, para a memória de todo o país, particularmente na primeira metade do século XX): o Arquivo Sonoro Digital do Museu do Fado (Lisboa).
Este arquivo contém alguns milhares de gravações datadas da primeira metade do século XX; muito fado (em vários sentidos da palavra), mas não só.

O que nos interessa aqui é que entre as gravações disponíveis estão algumas de estudantes do Porto da década de 1920. Sobre os dois que serão mais relevantes, Carlos Leal e Amândio Marques, já apareceram neste blogue algumas entradas: Carlos Leal, «O Rouxinol do Ave», "Tempos da fadistação...", Carlos Leal - caricatura, Registos fonográficos de Carlos Leal e Amândio Marques, Fado de Despedida cantado por Carlos Leal (esta última a partir de hoje claramente obsoleta).
Apresento a seguir uma lista das gravações destes e de alguns outros estudantes do Porto dos anos 1920, que consegui identificar até agora no Arquivo Sonoro Digital.
Sobre as autorias das composições gravadas por Carlos Leal, socorri-me das informações de António Nunes e Anjos de Carvalho (nomeadamente na 2.ª versão de Registos fonográficos do estudante da Universidade do Porto, Carlos Leal) - embora num ou noutro caso eu seja um pouco mais céptico (por exemplo quanto ao qualificativo «popular»).


I - Carlos Leal (c)
acomp. Amândio Marques (g), Francisco Fernandes (g), Pais da Silva (v)

Gravações disponíveis em: Carlos Leal - Arquivo Sonoro Digital (atenção: os títulos e informações de «Canção das rendelheiras de Vila do Conde» e «Melâncolia» estão trocados)

Fado Alentejano
(Música: Armando Goes / Letra: 1.ª quadra de autor desconhecido (popular, séc. XIX); 2.ª quadra de João da Silva Tavares)

Fado da Descrença
(Música: Amândio Marques / Letra: Amândio Marques?)

Fado da Nostalgia
(Autor(es) desconhecido(s) - «popular»)

Um Fado
(Música: Albano de Noronha / Letra: autor(es) desconhecido(s), 1.ª quadra popular)

Fado de Despedida
(Música [com o título Fado do Mar]: D. José Pais de Almeida e Silva / Letra: autor(es) desconhecido(s))

Minha Mãe (Fado)
(Autor(es) desconhecido(s), 1.ª quadra popular)

Canção das Rendilheiras de Vila do Conde
(Música: Carlos Leal? / Letra: Artur da Cunha Araújo, isto segundo António Nunes e Anjos de Carvalho; a etiqueta do disco indica «popular»)
Para ouvir esta gravação, clicar em «Melâncolia» em Carlos Leal - Arquivo Sonoro Digital.

Melancolia
(Música [com o título O meu Fado]: Armando Goes / Letra: 1.ª quadra de Domingos Garcia Pulido, 2.ª quadra de José Marques da Cruz, segundo António Nunes e Anjos de Carvalho; a etiqueta do disco atribui a autoria [da música?] ao próprio Carlos Leal)
Para ouvir esta gravação, clicar em «Canção das rendelheiras de Vila do Conde» em Carlos Leal - Arquivo Sonoro Digital.

II - Amândio Marques (g)
acomp. Pais da Silva (v), Francisco Fernandes (g)
Gravações disponíveis em: Amândio Marques - Arquivo Sonoro Digital

Variações em ré menor
(Autor desconhecido - «popular»)

Fado em lá maior
(Autor desconhecido - «popular»)

Capricho
(Aires Pinto Ribeiro)

Fado em dó sustenido menor
(Aires Pinto Ribeiro)

III - Pais da Silva (v)
acomp. José Taveira (v) [excepto em Cantares Populares]
Gravações disponíveis em: Pais da Silva - Arquivo Sonoro Digital

Pas de Quatre
(Autor desconhecido - «popular»)

Padre Nuestro
(Enrique Delfino)

Amanhecendo
Tango (Pais da Silva)

Cantares Populares
(rapsódia; arr. de Pais da Silva?)

IV - Ernesto Brandão (g)
acomp. José Taveira (v)
Gravações disponíveis em: Ernesto Brandão - Arquivo Sonoro Digital

Fado em sol maior
(Autor desconhecido - «popular»)

Fado em ré menor
(Autor desconhecido - «popular»)

V - Manuel R. Pereira Leite (g) e José Taveira (v)
Gravações disponíveis em: Manuel R. Pereira Leite, José Taveira - Arquivo Sonoro Digital (atenção: a primeira das duas gravações identificadas aí como «Fado Pinto Ribeiro (fá sustenido menor)» é na verdade «Fado Pinto Ribeiro (dó sustenido menor)», como se pode ler na etiqueta do disco)

Fado João de Deus (Variações) 1.ª parte
(João de Deus, filho - tema original)

Fado João de Deus (Variações) 2.ª parte
(João de Deus, filho - tema original)

Fado Pinto Ribeiro (dó sustenido menor)
(Aires Pinto Ribeiro)

Fado Magiolo
(Magiolo, Magiolly, Maggyoli, Maggiolli,...?)

Fado Pinto Ribeiro (fá sustenido menor)
(Aires Pinto Ribeiro)

Fandango Mirandês
(Manuel R. Pereira Leite)

VI - Manuel R. Pereira Leite (g)
acomp. Alves Rente (v)
Gravação disponível em: Manuel R. Pereira Leite - Arquivo Sonoro Digital

Chula do Douro
(Júlio Silva)

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Fado de Despedida cantado por Carlos Leal

Apresento aqui um exemplo de um fado gravado por Carlos Leal (sobre este estudante do Liceu Rodrigues de Freitas e da Faculdade de Medicina do Porto dos anos 1920, cantor de fados de Coimbra, serenateiro e vocalista da Tuna Académica do Porto, ver os textos Registos fonográficos de Carlos Leal e Amândio Marques, "Tempos da fadistação..." e Carlos Leal, «O Rouxinol do Ave», neste blogue).

Esta não é a composição mais interessante das que foram gravadas por Carlos Leal, nem a que foi mais popular. Mas é um dos lados do único disco que possuo de Carlos Leal (tenho gravações em cassete de outros discos, que me foram cedidas há uns 15 anos, mas sem autorização para as tornar públicas).

Como se nota facilmente, faltam nesta gravação os últimos segundos. Além disso, como é natural numa gravação de um disco de 78rpm, sem tratamento posterior, há bastante ruído. Mas, ainda assim, é uma voz que nos chega dos anos 1920...


Sobre este fado, uma versão do Fado do Mar de D. José Pais de Almeida e Silva, ver o texto Registos fonográficos de Carlos Leal e Amândio Marques, de José Anjos de Carvalho e António Manuel Nunes.
A letra do original pode ser consultada no texto dos mesmos autores Relação do espólio fonográfico do cantor Almeida d'Eça.

Quanto à letra cantada por Carlos Leal, confesso que ouço as seguintes quadras, ligeiramente diferentes das entendidas pelo Coronel Anjos de Carvalho e António Nunes.

Uma despedida, no dia
em que se vai de verdade,
é choro duma alegria
que se transforma em saudade.

Que tristeza e tormento
sinto no meu coração!
Mocidade, és qual vento,
fugindo sem ter razão.


Agradecimentos: José Moças (Tradisom) e José Navia (Audiorestauración).

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Registos fonográficos de Carlos Leal e Amândio Marques

Por José Anjos de Carvalho e António Manuel Nunes
[versão ligeiramente revista de um texto publicado originalmente em Junho de 2006 no blogue Guitarra de Coimbra I, de Octávio Sérgio]

Uma Justificação
Uma interrogação sobre o “desconhecido” Carlos Leal, presente na memória descritiva da solfa de “Fado Alentejano” gravado pelo estudante da Fac. de Medicina da Universidade de Coimbra Armando Goes no ocaso da década de 1920, motivou um comentário esclarecedor do Dr. João Caramalho Domingues no Blogue Guitarra de Coimbra I de 20.12.2005, seguido de novas colaborações em 26.12.2005 [1, 2, 3] e 08.01.2006 [1, 2].
De Carlos Leal se navegou para o guitarrista Amândio Marques (1903-1987), cujo nome já havia sido aflorado por Armando Luís de Carvalho Homem em texto de 1999.
Os pedidos de ajuda estenderam-se à Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra no Porto (Dr. António Moniz Palme), à Casa da Beira Alta no Porto (Dra. Maria Fernanda Braga da Cruz), bem como aos arquivos da Ordem dos Médicos e da Ordem dos Advogados.
Por sugestão da Dra. Maria Fernanda Braga da Cruz (inexcedível na abertura dos arquivos da Casa da Beira Alta) aguardámos entre Janeiro e Junho de 2006 uma hipótese de contacto com o filho do falecido guitarrista Amândio Marques, que acabaria por se revelar frustrada.
Gorada a primeira tentativa de contactos, optámos pela edição de uma primeira versão deste estudo no Blogue Guitarra de Coimbra I, postado em 28.6.2006, tecido e urdido apenas com os dados a que foi possível aceder.
O acesso ao grosso da obra fonográfica de Carlos Leal fica a dever-se à generosidade do Dr. João Caramalho Domingues, estudioso e coleccionador que em meados da década de 1990 obteve antigos documentos sonoros relativos ao Porto académico graças a contactos havidos com Paul Vernon. Tais contactos nasceram da necessidade de introduzir correcções nos textos que Paul Vernon autografou para as reedições Heritage/Tradisom. Infelizmente, nos traslados sonoros vindos de Londres em cassete, não houve oportunidade de anotar as autorias impressas nas etiquetas dos discos de 78 rpm gravados na década de 1920 e sem este elemento não nos é possível progredir com segurança numa matéria tão fugaz, considerada mais do domínio do património industrial e menos da arquivística sonora.

I – Notas Biográficas
Carlos Alberto Leal
, filho de Alberto Hermano Fernandes Leal e de Laura do Patrocínio e Silva nasceu em Vila do Conde a 22 de Agosto de 1905. Fez os seus estudos secundários no Liceu Rodrigues de Freitas, da cidade do Porto. Matriculou-se na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, então instalada no Hospital de Santo António (propriedade da Santa Casa da Misericórdia) no ano lectivo de 1924-1925. Terminou o curso de Medicina em 4 de Novembro de 1933, conforme certidão apresentada à Ordem dos Médicos. Exerceu Medicina, com consultório na Rua Mouzinho da Silveira, n.º 72 – 2.º -Porto, tendo prestado colaboração à Faculdade de Medicina da UP, instituição onde trabalhou ao lado de um antigo colega de liceu, de curso e de serenatas, Luís Canto Moniz. Faleceu em 11 de Abril de 1960.
Filho de um cantor e músico, Carlos Leal foi solista de relevo em serenatas académicas do Liceu e da Universidade do Porto, com assídua colaboração nos organismos estudantis do seu tempo (Orfeão e Tuna), récitas e eventos musicais.
Era um tenor operático que conhecia e dominava o “estilo de Coimbra” mais em voga na década de 1920. Apresenta uma fonética cuidada que procura ir de encontro à “pronúncia de Coimbra” e, como cantor, supera sem favor os desempenhos de José Dias e António Batoque. Excluindo “Canção das Rendilheiras de Vila do Conde”, uma canção com refrão mais próximo dos reportórios de tuna, teatro e salão burguês, a obra gravada por Carlos Leal radica esmagadoramente em espécimes estróficos, ao tempo os mais trauteáveis e apreciados pelo grande público e os mais fáceis de improvisar numa serenata nocturna de cortejamento (não estavam associados a arranjos instrumentais individualizadores nem exigiam esforço técnico-criativo ao instrumentista).
As quadras cantadas, à semelhança do que se praticava em Coimbra e nos bailes populares provinciais de arraial e amanho do milho, são por vezes de fraca densidade semântico-literária. Algumas eram cantadas em diferentes melodias como a tétrica “A noite é negra” e “Passam-se noites inteiras” e as coplas vulgarizadas em “O Meu Fado” de Armando Goes (“Nunca chores junto à nora”), que dizem da morbidez soturna marcada pelos referentes estéticos em que reviam ultra-românticos e decadentistas.

Amândio Ferreira Marques nasceu em Mangualde no dia 3 de Julho de 1903. Fez os estudos secundários no Liceu Rodrigues de Freitas, da cidade do Porto, tendo sido colega, amigo e companheiro de serenatas de Carlos Leal, José Pais da Silva, bem como do jovem transmontano Jorge Alcino de Morais “Xabregas” que depois estudou Ciências e Matemática em Coimbra e se dedicou ao toque da guitarra.
Na segunda metade da década de vinte Amândio Marques frequentou a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, com formatura concluída em 21 de Julho de 1930, precisamente no mesmo ano do guitarrista Afonso de Sousa e do barítono Armando Goes. Inscreveu-se na Ordem dos Advogados em 24 de Julho de 1931. Tudo indica que realizou o estágio profissional no Porto, cidade onde teve banca de advogado até falecer em 1987. Distinguiu-se como sócio fundador e animador cultural da Casa da Beira Alta no Porto, instituição que guarda a sua ficha de sócio, um retrato e um busto em bronze.
Nos tempos do liceu e também enquanto estudante de Coimbra, Amândio Marques afirmou-se com executante de guitarra. Todavia o seu nome não consta dos anais da “Década de Oiro” da Canção de Coimbra. Em 1927 promoveu um encontro entre cultores de Canção de Coimbra activos no Porto e em Coimbra. Num “in memoriam” a Carlos Leal, publicado nos inícios da década de 1960 (Carlos Leal. O Rouxinol do Ave. Porto: Porto Académico, 1962, 44-46), Amândio Marques informa que esteve ligado a um grupo activo no Liceu Rodrigues de Freitas onde apareciam habitualmente Carlos Leal, Luís Canto Moniz, Josué da Silva e o próprio Amândio Marques. Em fase posterior, a formação viu-se enriquecida com os préstimos de candidatos a tocadores, poetas e cantores como Francisco Fernandes (g), Alberto de Serpa, Pereira Leite (g), Carlos Alberto de Carvalho, Alberto do Carmo Machado, o Sargento Cadete, António Abrantes e Jorge Alcino de Morais. Este ciclo artístico liceal deve ter ocorrido entre ca. 1922-1925.
Dos guitarristas mais conhecidos no Liceu do Porto na primeira metade da década de 1920, Amândio Marques cita expressamente Aires Pinto Ribeiro, Ernesto Brandão, Cícero de Azevedo, Manuel Pereira Leite e Amândio Marques. Como cantores brilhavam e disputavam as palmas Carlos Leal e José Taveira, seguindo-se-lhes Mário Delgado Viemonte, Cabral Borges e Carlos Alberto de Carvalho.
Amândio Marques é na actualidade um guitarrista totalmente esquecido, não obstante ter gravado discos com o cantor Carlos Leal, e ainda matrizes fonográficas de guitarradas de sua própria autoria. Não se sabe se desempenhou alguma influência artística nos meios académicos portuenses após 1930, nem há respostas para o “apagamento” da sua vida e obra em Coimbra. Tudo indica que nos anos de Coimbra Amândio Marques continuou a manter o seu “Trio de Guitarras e Viola”, fruto de deslocações periódicas à cidade do Porto.
Outro guitarrista com passagem liceal pelo Porto, chegado a Coimbra em 1925, foi Jorge Alcino de Morais “Xabregas”. Xabregas manteve os contactos com os antigos colegas de Liceu e em 1929 efectuou gravações com alguns dos instrumentistas referidos no artigo dado à estampa por Amândio Marques em 1962. As matrizes fonográficas da sessão Xabregas nunca chegaram a ser comercializadas e em declarações de 15.4.1989 este guitarrista não conseguiu especificar os nomes dos tocadores seus “amigos da Universidade do Porto” que lhe prestaram colaboração em estúdio.
Em termos de guitarra de acompanhamento, Amândio Marques revela-se um executante superior a Xabregas, claramente posicionado acima da mediocridade reinante na década de 1920. O acompanhamento de “Canção das Rendilheiras”, com as guitarras em segunda voz muito cantada, supera com manifesto sucesso o tradicional toque por acordes de tónica e dominante. O Trio de Guitarras e Viola presente nos diversos discos de Carlos Leal revela assimilações da técnica de Artur Paredes em termos de trabalho de harmonização. Ao tempo, a formação duas guitarras mais um violão de cordas de aço não era uma prática vulgar. Inferiores aos desempenhos do trio liderado por Amândio Marques nos discos de Carlos Leal, são os desempenhos rudimentaríssimos audíveis nos discos de José Paradela de Oliveira, José Dias, António Batoque, António Menano e Elísio de Matos. Estamos a falar de nomes habitualmente exaltados como Flávio Rodrigues (voz António Menano), Francisco da Silveira Morais (voz Paradela de Oliveira) ou mesmo Paulo de Sá (vozes José Dias e Elísio de Matos).
José Pais da Silva foi aluno da Universidade do Porto, executante de violão de cordas de aço e membro da Tuna Académica do Porto. Parece ser autor de alguns dos temas gravados em disco por Carlos Leal, embora não possamos especificar quais com inteira segurança.
Sobre Francisco Fernandes, executante de segunda guitarra nas gravações de Carlos Leal, não existem informações disponíveis. Pelo “in memoriam” que Amândio Marques dedicou a Carlos Leal, sabe-se que à entrada da década de 1960 Francisco Fernandes exercia Medicina em Moçambique.
O presente levantamento contém avultadas omissões e lacunas. Não foi possível aceder a qualquer dos discos onde Amândio Marques toca a solo as suas guitarradas, pelo que nos limitamos a um arrolamento sumário. No que a Carlos Leal respeita, também nos faltou o acesso às matrizes fonográficas. As cópias facultadas pelo Dr. João Caramalho Domingues permitem-nos confrontar as melodias com outras conhecidas e transcrever, com alguma fiabilidade, as letras cantadas. Sem os discos não é possível visualizar as etiquetas e através delas colher os dados relativos às identificações autorais.

II – Gravações de Amândio Marques
Nos finais da década de 1920, entre 1927 e 1929, Amândio Marques gravou na editora Parlophone quatro faixas sonoras. Contou com a colaboração de Francisco Fernandes (2ª guitarra) e de José Pais da Silva (violão de cordas de aço).
Não conhecemos estas guitarradas, nem tampouco lográmos aceder aos discos.

Disco de 78 rpm Parlophone, B 33.016
98000 - Fado em Ré Menor
98001 - Variações em Lá Maior

Disco de 78 rpm Parlophone, B 33.017
98005 - Fado em Dó Sustenido Menor
98009 - Capricho

De outros colegas de Carlos Leal/Amândio Marques activos no Porto académico na década de 1920, importa escalpelizar:
  • Ernesto BRANDÃO, guitarrista, com pelo menos um disco gravado ca. 1927-1929, acompanhado em violão por José TAVEIRA: (78 pm Parlophone, B 33.006) “Fado em Sol Maior” e “Fado em Ré Menor”;
  • José PAIS DA SILVA e José TAVEIRA, com pelo menos dois discos gravados na Parlophone, ca. 1927-1929, contendo solos de dois violões: “Pas de Quatre” e “Padre Nuestro” (Parlophone, B 33.004); “Cantares Populares” e “Amanhecendo” (Parlophone, B 33.005).


III – DISCOGRAFIA DE CARLOS LEAL
A vida é negra, tão negra
Disco Parlophone, B 33.300
98028 – FADO ALENTEJANO (Fechei a porta à desgraça)
98029 – FADO DA DESCRENÇA (Eu não creio por não crer)

Disco Parlophone, B 33.301
98030 – UM FADO (Passam-se noites inteiras)
98032 – FADO DA NOSTALGIA (A vida é negra, tão negra)

Disco Parlophone, B 33.302
980…– FADO VISÃO (…?...)
980… – UMA CANÇÃO (…?...)

Disco Parlophone, B 33.303
98020 – MINHA MÃE (Minha mãe é pobrezinha)
98021 – FADO DE DESPEDIDA (A despedida no dia)

Disco Parlophone, B 33.308
98022 – MELANCOLIA (A saudade faz lembrar)
98023 – CANÇÃO DAS RENDILHEIRAS DE VILA DO CONDE (Rendilheiras que teceis)

IV – LETRAS GRAVADAS POR CARLOS LEAL

FADO ALENTEJANO
Incipit: Fechei a porta à desgraça
Música: Armando do Carmo Goes (1906-1967)
Letra: 1.ª quadra popular (séc. XIX); 2.ª quadra de João da Silva Tavares (1893-1964)
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1920

I
Fechei a porta à desgraça,
Entrou-me pela janela;
Quem nasceu para a desgraça
(Ai2) Não pode fugir a ela!

II
Tanto a desgraça me alcança,
Que já me sinto cansado
Da vida que não se cansa
(Ai2) De me fazer desgraçado.


Informação complementar:
Composição musical estrófica. Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 3.º verso, canta-se o 2.º dístico e repete-se o 2.º dístico.
Espécime gravado por Carlos Leal entre 1928-1929, acompanhado pelo Trio de Guitarras e Viola, constituído por Amândio Marques/Francisco Fernandes (gg) e Pais da Silva (v) no 78 rpm Parlophone B, B 33.300. A autoria da música é de Armando Goes, que a gravou em Outubro de 1928, acompanhado à guitarra por Albano de Noronha e Afonso de Sousa (Disco His Master’s Voice, E.Q. 192).
A 1.ª quadra é popular e encontra-se em variadíssimos cancioneiros, tais como “Mil Trovas Populares Portuguesas” e em António Tomás Pires, Leite de Vasconcelos e outros. A 2.ª quadra é do poeta João Silva Tavares, e encontra-se no livro “Quem Canta”, editado em 1923.
Este disco de Carlos Leal encontrava-se ainda em catálogo e à venda em 1946.
Tema gravado por António Bernardino em 1966, acompanhado à guitarra por António Portugal e Manuel Borralho e, à viola, por Rui Pato (EP Fados de Coimbra, Alvorada AEP 60817); está disponível em long play (LP Coimbra, Alvorada ALV-04-19 e LP Aquila, AQU 02-49) e em compact disc (CD N.º 45/O Melhor dos Melhores, Movieplay, MM 37.045 e CD Nº 30/Clássicos da Renascença, Movieplay, MOV. 31.030).
Gravado também por Victor Silva, em 1986, do Grupo Académico Serenata, do Porto: LP “Fados de Coimbra”, Orfeu, LPP 44.
Com um outro título e uma outra letra, foi gravado por Raul Dinis, acompanhado à guitarra por Jorge Gomes e António Ralha e, à viola, por Manuel Dourado, intitulado Um Fado (Ó vida, que mais queres), letra da autoria do cantor (CD “Coimbra de Sempre”, Discossete, DDD CD 971000, de 1993).

FADO DA DESCRENÇA
Incipit: Eu não creio por não crer
Música: autor não identificado
Letra: autor não identificado
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1920

I
Eu não creio por não crer,
Queria crer mas não consigo
E assim eu passo a descrer,
É para crer só contigo.

II
Podem descrente chamar
A quem pensa como eu…
Há estrelas a brilhar
Que não se vêem do céu.


Informação complementar:
Composição musical estrófica. Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 2.º e repete-se.
Gravado por volta de 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.0300, master 98029). Este disco de Carlos Leal encontrava-se ainda em catálogo e à venda em 1946. Desconhecemos se mais alguém teria gravado este fado.

UM FADO
Incipit: Passam-se noites inteiras
Música: autor não identificado
Letra: autor não identificado
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1920

I
Passam-se noites inteiras
Que me não posso deitar
E a lua já tem olheiras
De tanto me alumiar.

II
Já o luar, de mansinho,
No vento reza de dor,
Anda a pintar de branquinho
Na casa do meu amor.


Informação complementar:
Composição musical estrófica. Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 2.º e repete-se.
Gravado por volta de 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.0301, master 98030). Este disco de Carlos Leal encontrava-se ainda em catálogo e à venda em 1946.
Uma variante (Eu passo noites inteiras) da 1.ª quadra é cantada por Fernando Gomes Alves (EP Ofir, AM 4.068, 1966) no chamado Fado Antigo (Eu passo noites inteiras), cuja música é a do conhecido Fado Espanhol (Gosto de cantar o fado) gravado por António Menano. No 2.º verso da 2.ª quadra admitimos que a letra cantada por Carlos Leal não seja exactamente o que nos pareceu continuar a ouvir após múltiplas re-audições de estudo. Admitimos que este UM FADO possa ser o espécime que João Falcato diz ter ouvido Manuel Julião entoar na Sé Velha na Primavera/Verão de 1943 (Coimbra dos Doutores. Coimbra: Coimbra Editora, 1957, pág. 166).
Desconhecemos se mais alguém gravou este espécime.

FADO DA NOSTALGIA
Incipit: A vida é negra, tão negra
Música: autor não identificado
Letra: 1.ª quadra popular; 2.ª quadra de autor não identificado
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1930

I
A vida é negra, tão negra,
Como a noite nos pinhais
Mas é nas noites mais negras
(Ai2) Que as estrelas brilham mais.


II
Nesta vida de amargura,
Há tanta contradição…
Fumo negro sobe ao ar
(Ai2) Água pura cai no chão.


Informação complementar:
Composição musical estrófica. Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 2.º e repete-se.
Gravado por volta de 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.0301, master 98032). Este disco de Carlos Leal encontrava-se ainda em catálogo e à venda em 1946.
A 1.ª quadra (A vida é negra, tão negra) veio a ser incorporada em 1930 no Fado da Noite (A vida é negra, tão negra), música de Jorge de Morais (Xabregas), primeiramente gravado por Machado Soares em 1956 (EP Alvorada, MEP 60111).
Desconhecemos se mais alguém gravou este espécime.

FADO VISÃO
Música: autor não identificado
Letra: dados desconhecidos
Edição musical: desconhecemos a sua existência

Informação complementar:
Apenas conhecemos a existência do respectivo disco, o disco Parlophone, B 33.302, que ainda se encontrava em catálogo e à venda em 1946.

UMA CANÇÃO
Música: autor não identificado
Letra: desconhecemos a letra e respectiva autoria
Edição musical: desconhecemos a sua existência

Informação complementar:
Apenas conhecemos a existência do respectivo disco, o disco Parlophone, B 33.302, que ainda se encontrava em catálogo e à venda em 1946.

MINHA MÃE
Incipit: Minha mãe é pobrezinha
Música: indicada como “popular”
Letra: 1.ª quadra popular; 2.ª quadra de autor não identificado
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1920

I
Minha mãe é pobrezinha,
Não tem nada que me dar.
Dá-me beijos, coitadinha,
(Ai2) E depois põe-se a chorar!

II
Quem me dera minha mãe,
A santa que eu vi sofrer,
Dizem as santas no céu
(Ai2) Que morreu pra eu viver.


Informação complementar:
Composição musical estrófica. Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 2.º e repete-se.
Gravado por volta de 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.0303, master 98020). Este disco de Carlos Leal encontrava-se ainda em catálogo e à venda em 1946.
A 1.ª quadra ocorre também noutras melodias:
-Fado Triste (Minha mãe é pobrezinha), [na verdade Fado da Minha Mãe] gravado por António Menano, primeiro em Lisboa e depois em Berlim (discos Odeon, 136.822 e A 136.822 e LA 187.804), cuja música é de Alexandre Rezende;
-Fado Mondego (Minha mãe é pobrezinha), [na verdade Fado Espanhol] gravado pelo mezzo soprano D. Luísa Baharem, em finais de 1926 (disco Columbia, 1032-X, edição americana);
-D’Um Olhar (As meninas dos meus olhos), música de Alexandre de Rezende dedicada a António Menano, de que foi feita edição musical em 1915, mais conhecido por «As Meninas dos Meus Olhos», gravado por António Menano (discos Odeon, 136.821 e A 136.821). A referida quadra consta da edição musical impressa, mas não nas matrizes gravadas por António Menano.
Desconhecemos se mais alguém gravou este fado.

[FADO DE DESPEDIDA]
Título original: FADO DO MAR
Incipit: A despedida, no dia
Música: D. José Pais de Almeida e Silva (1899-1968)
Letra: autor não identificado
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1920
I
A despedida, no dia
Em que se faz de verdade,
É choro duma alegria
Que se transforma em saudade.

II
Que tristeza, que tormento
Sinto no meu coração!
Mocidade és qual o vento
Fugindo sem ter razão.


Informação complementar:
Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 2.º e repete-se.
Composição musical estrófica gravada por volta de 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.303, master 98021). Este disco de Carlos Leal encontrava-se ainda em catálogo e à venda em 1946.
A melodia é rigorosamente a mesma de FADO DO MAR (As ilusões que me perseguem), gravado em 1929 por Artur Almeida d’Eça, acompanhado por Albano de Noronha/Afonso de Sousa (gg) no disco de 78 rpm Polydor , P 42.127.

MELANCOLIA
Incipit: A saudade faz lembrar
Música: autor não identificado
Letra: 1.ª quadra de Domingos Garcia Pulido; 2.ª quadra de José Marques da Cruz
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: década de 1920

I
A saudade faz lembrar
A melopeia da nora,
Se a uns parece cantar,
Parece a outros que chora.


II
Nunca chores junto à nora
Que a corrente faz girar,
Quem chora ao pé de quem chora
Fica-se sempre a chorar.


Informação complementar:
Canta-se o 1.º dístico, repete-se, canta-se o 2.º e repete-se.
Composição musical estrófica gravada por volta de 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.0308, master 98022).
Ambas as quadras se cantam também, mas por ordem inversa, com o chamado Fado da Nora (Nunca chores junto à nora), de Armando Goes, cuja música é diferente.
Desconhecemos se mais alguém teria gravado este fado.

CANÇÃO DAS RENDILHEIRAS DE VILA DO CONDE
Incipit: Rendilheiras que teceis
Música: Carlos Alberto Leal
Letra: Artur Cunha Araújo
Edição musical: desconhecemos a sua existência
Data da composição: 1928

Rendilheiras que teceis
As finas rendas à mão,
Eu dou-vos, se vós quereis,
Pra almofada o coração.


Refrão
Ó vem à janela
Como a noite é bela,
Vem ver o luar;
Linda rendilheira
Deixa a travesseira,
Vem-me ouvir cantar.


Quem me dera, rendilheira,
Ser essa tua almofada
E passar a vida inteira
Em teu regaço, deitada.


Refrão
Ó vem à janela…etc.

Informação complementar:
Canção musical com refrão gravada entre 1928-1929 por Carlos Leal, acompanhado à guitarra por Amândio Marques e Francisco Fernandes e, no violão, por Pais da Silva (disco Parlophone, B 33.308, de 78 rpm).
Esta canção foi popularíssima em todo o Portugal, tendo conhecido assinalada difusão nos anos dourados da Emissora Nacional. Também foi popular em Coimbra na década de 1930, cidade onde era cantada por estudantes e populares.
Na década de 1960 foi gravada pelo tenor radiofónico Américo Silva, acompanhado à guitarra por Armandino Maia e António Parreira e, à viola, por J. M. de Carvalho e José Vilela (EP “Américo Silva canta Fados de Coimbra”, Estúdio, EEP 50.228, com a errada indicação de ser música de Ângelo Vieira Araújo).
Também foi gravada por João Queiroz sob o título Canção das Rendilheiras (EP “The Old Coimbra Fado III”, RCA Victor, TP-313 (ca. 1967), cantor que após fugaz passagem pelo grupo dos irmãos Plácidos se radicou em Lisboa; LP “Fados de Coimbra por João Queiroz”, RCA Camden, CL-40220, editado em 1981 e LP “Estrelas de Portugal”, RCA Victor LPV-7649, editado na Venezuela).
Nestes três discos figuram como autores os nomes de Manuel Tino e Hugo Rocha, supondo-se atribuição de letra de Manuel Tino e de música de Hugo Rocha. Num outro disco de João Queiroz figuram os nomes de Manuel Pino e Ugo Rocha (sic): LP “João Queiroz – Samaritana”, Interfase, IF 144, editado em 1987.
As autorias fornecidas por João Queiroz não se nos asseveram fiáveis. Tanto poderão ter sido indicadas pelo cantor Loubet Bravo (que estaria familiarizado com o tema desde a sua juventude portuense), como por frequentadores das casas de fados de Lisboa onde o cantor se movimentava.
“Canção das Rendilheiras” é considerada uma espécie de hino de Vila do Conde. Foi adoptada como hino oficial do Rancho da Praça (http://www.rancho-da-praca.com/paginas/FotoRendilheira.html), agrupamento que efectuou sucessivas gravações do tema em 1960 (EP “É isto Vila do Conde”, Alvorada), 1964, 1966, 1976, 1977, 1992, em vinil, cassetes e cd (http://www.rancho-da-praca.com/paginas/musicas1_mp3.html).

Pesquisa e texto: José Anjos de Carvalho e António M. Nunes
Agradecimentos: Dr. João Caramalho Domingues e José Moças (Tradisom), Dra. Isabel Cambezes (Ordem dos Advogados), Ordem dos Médicos (Arquivo Central), Casa da Beira Alta no Porto, Rosa Soares (Ordem dos Médicos)