terça-feira, 4 de outubro de 2011

"Tempos da fadistação..."

[Carlos Leal, Porto Académico, n.º único de 1938, pág. 12.]


Porto Académico, que mundo de recordações invoca este nome, já velho, dos tempos da fadistação despreocupada e irrequieta. Quanta saudade e tristeza vão desenrolando diante dos meus olhos esses tempos em que pertenci, pode dizer-se, à última geração dos veteranos, dos velhos blagueurs, impenitentes perseguidores dos caloiros recém-chegados e revestidos ainda da velha casca provinciana e também dos grandes orientadores das maiores organizações artísticas, desportivas e jocosas que até hoje a Academia soube realizar.

Desde a coroação do Orfeão e Tuna Académica por terras de Madrid e Galiza em que se glorificaram as figuras do Dr. Clemente Ramos e Dr. Modesto Osório, às inúmeras excursões por terras portuguesas onde brilhavam para uns e irritavam a outros as piadas do Sobrinho das Barbas, do Mendes, do Zé Moreira, do João Ribeiro; desde as peças teatrais do Mendo e do Fariñas, à Aranha Verde e outras revistas do Poeta Rabeta, do Perry, do Zeferino, com música do Alberto David, do Lucena Sampaio, do Álvaro Rodrigues e outros, desde os actores consumados até aos célebres grupos de Girls que arrebatavam as plateias. Desde aquele clássico bailado das horas dançado pelo grupo dos barbudos, àquele colossal bailado do Bravo ali no S. João que deixou estupefactos todos aqueles que minutos antes o tinham visto entre-cenas. Desde as primeiras organizações do Carnaval que enchiam a cidade de gente vinda de toda a parte, até àquele célebre roubo da macaca ali nos Lóios que depois de doutorada honoris causa foi entregue com toda a solenidade na varanda do antigo Hotel Rainha...[1] tudo isso passa ainda com saudade diante dos meus olhos. E aquelas célebres excursões de cursos a terras da Galiza pletóricas de alegria moça e garotices... Nunca consegui saber quem foi o autor da piada que obrigou o Bravo a arrancar o forro do boné de polícia com que desempenhava brilhantemente aquele papel na comédia os Suicidas, uma das peças do reportório da nossa tournée por terras galegas.

Depois o pano desceu... e os antigos actores passaram a ser engenheiros, médicos, advogados jornalistas, etc.

Mas saudade bem grande, sinto eu ao recordar aquelas serenatas a horas mortas pelas ruas da cidade com o Aires, o Viamonte, o Milheiros, o Zé Taveira, o Rogério, o Amândio Marques, o Pereira Leite e o Guerra, vulgo tenor de cabeça.[2] Ao lado das notas sentimentais, quantas cenas picarescas duma comicidade natural e espontânea, passam ainda nas minhas retinas. No regresso das serenatas e depois de tremendas touradas aos gatos vadios, onde surgiam diestros valorosos, íamos acabar a noite ali no Transmontano, organizando sessões fadológicas debaixo da orientação do velho Mouzão já de cabeleira toda branca, do tenente Simão e outros carolas do fado e da guitarra...

Depois o fado morreu... morreu com as grafonolas e com o rádio. E foi esta grafonoloterapia e radioterapia que, ministrada em tão altas doses, provocou a dispepsia e o enjoo a toda a gente.
..........................................................

Nunca mais se ouviu uma serenata... e aos meus ouvidos, chega ainda o eco da minha própria voz nas noites luarentas de há dez anos, para arrelia dos mestres e encantamento dos sonhadores e... das sonhadoras, como o ultimo boémio duma geração que passou.

Maio de 38

CARLOS LEAL






[1] Cf. os textos "Bons tempos" e "O rapto da macaca".

[2] É possível que este "Guerra, vulgo tenor de cabeça" fosse o "Guerra da Cabeleira" referido num episódio, contado anonimamente, e sem qualquer referência à data em que se terá passado, no Porto Académico, n.º único de 1962, p. 45:

E ASSIM SE PERDEU O CRÉDITO...

O Morais, dono duma casa de «bons petiscos» na Rua do Almada - casa muito frequentada, durante a noite, pela Academia de outros tempos - tinha a fama e... o proveito de deitar água no vinho. Sendo amigo da rapaziada e tanto assim que até fiava a... longo prazo, o Morais, que admitia todas as brincadeiras, não suportava, por princípio algum, que o acusassem de mixordeiro. Pobre daquele que se atrevesse, de cara, a acusá-lo da mistura!... Nunca mais lhe fiava.

Era certo e sabido que a boémia académica de então, de regresso de qualquer serenata, abancava ali a altas horas da madrugada e, certa vez, o Morais mostrou desejos de ouvir o «fadinho» defronte da sua porta. Os rapazes resolveram satisfazer-lhe a vontade e, numa madrugada de Janeiro, com o luar a bater em chapadas, o Morais tinha à sua porta uma serenata com quatro guitarras, dois violões, três tenores e grande acompanhamento da Academia.

Tudo correu muito bem e, para fechar a serenata, ecoou pelo espaço a voz tenorina do «Guerra da Cabeleira», num fado muito em voga:
O vinho é sangue de Cristo
Que nossas mágoas suaviza
E é, talvez, por causa disto
Que o Morais o baptiza...
Caiu Tróia... E o Morais cortou o crédito à Academia...

12 comentários:

  1. Quase de propósito, este teu apontamento.

    Pertinentíssimo nos tempos que correm: pela primeira vez em quase 25 anos, o Grupo de Fados do OUP não foi convidado a tocar na Serenata Monumental de recepção ao caloiro da Academia do Porto.

    Os que se apossaram da Praxe em nome das negociatas escuras e que agora se querem apossar de tudo o que mexa e use traje, conseguiram o velho sonho.

    Tristes tempos, os da Academia do Porto. Ferve a indignação e a revolta dentro do OUP.

    Pessoalmente, é para mim um insulto. Desde 1969 que os estudantes do Porto não tocavam nas suas próprias serenatas. Mais uma vez o OUP ressuscita a tradição em 1988 e agora é enxotado a pretexto da vaidades ferida de quem nunca conseguiu que o OUP lhe fosse comer à mão.

    Vêm aí tempos interessantes.

    Aquele abraço,

    Eduardo

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  2. Eduardo,
    Nem sei por onde começar...

    Começo por um comentário que, devido ao que acrescento abaixo, é provavelmente irrelevante.
    Sinceramente, devo dizer que nunca simpatizei muito com lugares cativos em serenatas monumentais - sempre achei que os grupos a actuar deveriam ser escolhidos com base na sua qualidade no momento e não com base em os seus membros de há 10 gerações académicas atrás terem sido pioneiros. Seria capaz de abrir uma excepção para o grupo do OUP, pelo que o OUP representa na história académica do Porto - mas, se a qualidade não fosse suficiente, talvez com uma presença mais simbólica (assisti em determinadas alturas a diversas actuações do grupo de fados do OUP que deixavam a desejar e faziam pensar que o grupo se mantinha porque o OUP _tinha_ de ter um grupo de fados, mas sem grande convicção).

    Dito isto, pelo que conheço do "Magnum", não me parece que se preocupem com a qualidade dos grupos.
    Um sistema em que é um grupo de duxes a escolher quem actua aqui e ali é evidentemente absurdo - e não foi agora que se tornou absurdo.

    Um dia tenho de escrever aqui uma ou duas entradas sobre as tradições académicas, a(s) praxe(s) académica(s) e a Praxe (nefasta invenção, esta terceira) e sobre quais as competências que (na minha opinião e analisando precedentes históricos) deveriam ter os conselhos de veteranos.

    Mas a propósito dos "Tempos da fadistação": nesse tempo não havia serenatas com duxes e veteranos e finalistas em palco, e público interessado essencialmente em que a sua "casa" grite mais alto do que os rivais; as serenatas do Carlos Leal e colegas eram serenatas de quem estava interessado na música - e, claro, em fazer serenatas às moças.

    Um abraço,
    João

    P.S.: Queima de 1988? Julgava que tinha sido um ou dois anos antes. Um dia gostaria de ter uma lista dos grupos que fizeram as serenatas entre a interrupção dos anos 70 e o retomar do grupo do OUP. Pelas referências que já vi ou ouvi, parece ter havido uma variedade tremenda: serenatas que devem ter sido excelentes (grupo do Cunha Pereira) e outras para esquecer (fadistas de casas de fados).

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  3. Para o caso de alguém ler estes comentários, será melhor clarificar um pouco a terminologia própria que usei:
    nada tenho contra a praxe académica (desde que acompanhada de bom senso), como é natural; o que é nefasto é o que chamei de Praxe (com P maiúsculo, para distinguir) - um sistema, relativamente recente, a que se tenta submeter tudo o que seja tradição académica ("tudo o que mexa e use traje"), de forma que fica tudo regulamentável, codificável e submetido a uma hierarquia cuja legitimidade é de âmbito mais restrito.
    Infelizmente, esta Praxe tem vindo a matar as tradições académicas lentamente.

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  4. João:

    concordo inteiramente contigo nas críticas que teceste ao grupo de fados do OUP. Como imaginarás, doem-me na alma algumas coisas a que assisti da parte do grupo que ajudei a (re)fundar.

    Neste caso concreto, a Matilha de sabujos que vai (des)governando a "Praxe" (e se vai governando à custa dela) nem invocou sequer questões de qualidade ou falta dela: tanto bastou que considerassem que o OUP os ignorou porque não respondeu a uma convocatória (sim, leste bem) que enviou ao OUP - como se tivesse legitimidade para o fazer.

    A vaidade irritada (e irritante) desses cães-de-fila chegou a este ponto.

    Estamos em sintonia quanto àquilo que deve ser o papel de um conselho de veteranos - e que será diametralmente oposto àquele que tristemente tem sido desempenhado pelo actual MCV - composto em 90% por indivíduos que nem sequer se encontram matriculados... nem na U.P., nem fora dela.

    Aquele abraço!

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  5. Antes de mais, os meus parabéns ao Autor, pelo excelente trabalho desenvolvido em prol da história e, acima de tudo, da saudade.

    Quanto ao texto, apenas me questionei se o denominado "Guerra da cabeleira" Corresponde ou não ao Prof. Doutor Carvalho Guerra, outrora director da Católica - Porto, o qual é de facto conhecido por se ter movido nos meandros académicos, e de facto ser dotado destas duas características (farta cabeleira, e voz de trovão!)

    No que concerne ao comentário do Eduardo, parece-me ser efectivamente especulativo, senão vejamos: pessoalmente, não vejo o Magnum como um conjunto de ex-estudantes, aliás, se estiverem atentos à realidade das "casas", efectivamente a renovação em termos de "Duces" tem ocorrido com frequência...

    Muito menos vejo o dito Magnum como algo que quer acossar e subjugar as tradições académicas; do meu modesto ponto de vista, temos que ter aqui alguns factores em conta por forma a analisar estes dados com isenção.

    1 - O facto de, actualmente, existirem uma multiplicidade de casas que praticam a dita tradição académica, bem como, com particular relevo para o que irei referir seguidamente, praticam a praxe académica. Tal multiplicidade abrange, nas palavras do Eduardo, a U.P. e os designados "fora dela", sob pena de não se partilhar algo de tão belo com alguém, e que todos nós sentimos (egoismo!?)... Como referia, estas casas abrangem já (adivinho) mais de quarenta Universidades e Institutos na zona do Porto.

    2 - Esta multiplicidade de casas, com milhares e milhares de pessoas a pratica a tradição académica, é por demais belo, mas pode tornar-se perverso: sob o jugo da praxe académica, não raras vezes ouvimos falar de casos que extravasam os limites da mesma, e que não são mais nada do que factos a dirimir no domínio dos tribunais penais.

    Porém, muitos deles devem-se também ao descontrolo que existe em muitas dessas universidades e institutos, longe (fisica e em termos de carta de valores) de tudo o qual a Academia do Porto é.

    3 - As externalidades negativas que esses actos representam para os que, tal como todos nós, gostam e respeitam as tradições académicas, são por demais evidentes: a opinião pública choca-se com casos como os havidos em Macedo de Cavaleiros, na Lusíada de Famalicão (que ainda que o tribunal penal absolva, "da fama já não se livram"); a comunicação social, faminta de estórias suculentas para sugar, explora estes factos até à exaustão, dizendo, a breve trecho, que os estudantes são uma cambada de frustrados e alcoólicos, que procuram cravar no espírito dos mais novos tais características desviantes, pura e simplesmente, por vingança ou loucura; O Ministro Mariano Gago emite um comunicado que visa restringir a tradição académica; como exemplo, a Universidade do Minho já proíbe neste momento a praxe académica nas suas instalações; do que ouvi dizer, a Universidade do Porto tem instruções internas similares, que está a tentar implementar pouco a pouco...

    A consequência prática do aqui referido poderá ser a morte de algo que todos nós estimamos, a médio-longo prazo (sim, porque acredito que a curto prazo, os que ainda fazem parte dela irão lutar bravamente para a manter!!!).

    (Continua, que limitam-me a 4096 catacteres!!!)

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  6. E agora sim... Como dar solução a esta problemática? Aí efectivamente será necessário um conjunto de pessoas, que provenham dessas casas que não têm a "velha tradição", bem como das que têm e a perpetua, para se reunirem e a partilhar. Tal conjunto assume a forma de um órgão, ao qual incumbe regular essa matéria, sendo um orgão de conselho de veteranos, que por acaso, são os "Duces" da casa... O Magnum.

    Daí uma das finalidades que eu reconheço ao Magnum: que procure manter a tradição académica viva, evitanto os abusos existentes por vezes, e que, para tal, precisa da colaboração de TODOS...

    Agora poderia estar aqui a discutir um sem número de ideias, que se calhar são a raíz do problema, do pomo da discórdia... E vou mais além de quem tem que obedecer a quem, ou se, designadamente, não era obrigação do próprio OUP integrar esse Magnum, atendendo ao carácter histórico do mesmo, tendo por isso, muito a partilhar... Mas isso são mais achas para a fogueira, farpas desnecessárias no que eu pretendo aqui radicular.

    Claro que a expansão da tradição académica é positiva, quem me dera a mim que todos e cada um de nós, humanos, bebessemos gota a gota, instante a instante, tudo o que também nela absorvi, desde nobres valores até, estas sim, histórias de encantar. Essa é a base para que haja uma expansão da mesma a todas as universidades e institutos existentes...

    Porém, para essa expansão há um preço; a falta de tempo para passar a palavra, a multiplicidade de pessoas que se move sob o manto da capa da tradição académica... Se calhar, podemos afirmar que o Guerra da Cabeleira conhecia toda (ou quase) a Academia do Porto na altura... Hoje ninguém poderá dizer o mesmo!

    E por isso esta macrocefalia instalada, mas salvo melhor opinião, necessária... É que para evitar abusos, há de facto a necessidade de emitir instruções, por parte de alguém que tenha legitimidade, em cada uma dessas casas, para as implementar!

    Se é burocrático, macrocefálico, politizado, etc... Sim, concordo. Mas... Como o fazer então, de molde a resolver os problemas referidos neste texto a montante, e as suas consequências? É essa a pergunta que eu aqui deixo como desafio, numa "tertúlia virtual" que aqui vi, e à qual não pude deixar de deitar também "a minha acha para a fogueira"...

    Um abraço!

    António

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  7. Caro António:

    antes de mais, obrigado pelas achegas.

    Vou procurar clarificar um pouco o meu pensamento.

    Evidentemente, entendo que a existência de um conselho máximo de veteranos (é a esta a designação que lhe é dada no Código de Praxe de 1983 - aprovado na generalidade, mas ainda não na especialidade) é ou pode ser útil e eventualmente até necessária.

    Num plano puramente conceptual, é algo que não me oferece a mínima dúvida.

    Contudo, o órgão que actualmente existe está ferido de um conjunto de ilegalidades:

    1. não estão nele representadas todas as casas da academia - nem sequer de toda a Universidade do Porto;

    1.1. poder-se-ia aqui invocar o caso de instituições como as Fac. de Belas-Artes ou Arquitectura, que "tradicionalmente" estão contra as tradições académicas, razão pela qual não têm Conselho de Veteranos e, por essa mesma razão, não têm Dux. No entanto, este argumento não "pega", na medida em que esta falta pode ser suprida: basta que haja um elemento praxista em qualquer uma destas casas para que esse possa representar os alunos dessas instituições - quanto mais não fosse pela sua passagem a veterano por mérito académico, mesmo que não reunisse as condições efectivas para essa condição (v.g., ter mais matrículas do que as necessárias para a conclusão do curso).

    2. Mais grave: alguns dos que se apresentam como "Duces" não podem sê-lo. O exemplo gritante é o do "Dux" de Farmácia, que já não se encontra inscrito naquele curso desde 1999. Neste aspecto o Código é claro: no seu artigo 161 diz que o mandato de Dux Facultis termina automaticamente quando deixa de ser aluno da casa que representa ou quando a sua demissão é aceite pelo MCV. Não é caso único. No entanto, é facto, qualquer veterano pode assistir aos trabalhos do MCV, sem direito a voto. Ora o senhor em causa não só vota como até representa o Dux Veteranorum nos seus impedimentos.

    3. Face a estas situações, o MCV está ferido e ilegalidade, pelo que as suas decisões nem sequer podem ser vinculativas.

    4. Temos que o órgão que supostamente devia reger a Praxe, das duas, uma:

    a) não sabe nada de Praxe;
    b) sabe, mas não se importa.

    Se a), então que está a fazer? Se b), então que está a fazer?

    5. O Código define "Praxe" como as disposições nele contidas mais as que venham a ser decretadas pelo MCV. Repare-se só nas implicações filosóficas desta disposição: a Praxe é o que esses senhores vierem a decretar... escuso-me de fazer mais comentários.

    6. O próprio conceito de "conselho máximo de veteranos" é alheio à tradição portuense. Mas nem me vou meter por aqui. Vou apenas aos factos. Os primeiros Duces foram todos eles homens de mão do Transeptus - até aqui, estamos, penso eu, de acordo. Muito antes de as tradições terem reemergido em todas as casas da academia, já existia à revelia um MCV, que só teve de se apresentar como tal. Ou seja, o MCV não nasce de baixo para cima, mas é imposto de cima para baixo. Nem sequer foi formado "secundum praxis": na sua génese não estão nem a tradição nem a praxe. O organismo foi efectivamente pensado para controlar a praxe à nascença.

    (Continua)

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  8. (Continuação)

    7. Concedo, no entanto, que, na sua actual composição, formalmente não seja assim. Na prática, quem detém efectivamente o poder são os mais antigos (que não dispõem teoricamente do direito de voto). Ou seja, formalmente o MCV é um; na prática, é outro.

    8. A julgar pela inoperância do MCV perante tantos atropelos a que diariamente se assiste, das três, uma:

    a) - quer agir e tem força para agir, mas não sabe o que se está a passar;
    b) - sabe o que se está a passar e quer agir, mas não tem força para agir;
    c) - sabe o que se está a passar e tem força, mas não quer agir .

    O Dux Veteranorum disse-me ainda no sábado passado que "não é fácil controlar a academia"... O senhor desculpa-se com a imensidão do número de alunos.

    No entanto, esta teoria da treta cai pela base. O João deve ter assistido ao mesmo que eu. Na grande noite do fado académico do ISEP, num dos patamares do edifício da alfândega estava a exercer-se praxe... debaixo de telha e literalmente nas barbas de vários Duces - a começar nas do Dux Veteranorum. Alguém interpelou o indivíduo que passou a noite a incomodar o espectáculo?... Alguém lhe foi dizer que ali não era céu aberto? Alguém lhe foi às unhas ou rapou? Alguém protegeu os caloiros?

    Não.

    Mas não são esses os tais que?... São. E o que fizeram? Nada.

    Que conclusão se pode daqui extrair? Não se tratava de controlar toda a academia...

    Desde que os passes e livres-trânsitos estejam assegurados para a Queima, tudo está bem no Reino da Dinamarca... A última desses senhores era o seguinte: transformar a semana da recepção ao caloiro numa "pré-queima" dedicada aos caloiros, com o patrocínio da FAP. Que tem a dizer a isto, caro António? "Nós mobilizamos os caloiros; vocês tal e coisa." E diriam como o autor do Palito Métrico: "Se vou a vossos pés é para vir/Também alguma coisa à minha mão". Nunca a expressão "Comissionista" ganharia tanto sentido.

    A visão idílica que aparentemente tem do MCV é isso mesmo: idílica. Não corresponde, porém, e com muita pena minha, à realidade. O Américo é uma pessoa estimável, mas está rodeado de uma cambada de indivíduos para os quais ele é um mal necessário. Se ele resignar, vamos assistir a uma luta sem fim pelo poder. Enquanto ele se mantiver, porque é incontestado, então tudo se mantém como até agora.

    Finalmente, o OUP. O OUP não tem nada que estar representado no MCV, uma vez que nel só têm assento os veteranos. Ora os veteranos do OUP não são necessariamente veteranos na academia, pelo que nem podem assistir aos trabalhos. Segundo ponto, o OUP é um organismo artístico, não praxístico, e responde apenas perante a Reitoria da U.P., da qual é uma unidade orgânica. Seria o mesmo que os Serviços Sociais terem assento no MCV.

    Abraço e apareça sempre!

    Eduardo

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  9. Caro António,

    Obrigado pelos cumprimentos. Eu gostava de ter mais tempo para colocar aqui material e textos meus. Ideias não faltam...

    Para já, apenas o que é rápido de responder.
    Não creio que o "Guerra da cabeleira" fosse o Prof. Carvalho Guerra. A principal razão é o facto de o Prof. Carvalho Guerra ter sido estudante na UP entre 1954 e 1956 (tinha-se bacharelado na UL). Ora, este texto, publicado em 1962, fala na "Academia de outros tempos", o que me sugere que a história teria mais de 8 anos. Para além disso, não tenho informação de que o Prof. Carvalho Guerra alguma vez tenha andado nos fados e guitarradas; pelos menos, não consta no texto do Prof. Carvalho Homem
    http://guitarradecoimbra.blogspot.com/2005/08/fado-o-de-coimbra-na-academia-do-porto.html
    que é bastante exaustivo para os anos 40 a 70. Finalmente, não sei se a "voz de trovão" do Prof. Carvalho Guerra será compatível com a "voz tenorina" do "Guerra da cabeleira".

    Abraço,
    João Caramalho

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  10. Eduardo,
    Quase completamente de acordo.

    Ressalvas e acrescentos:

    1 - Tenho alguns problemas com a "Academia" (que é definida por quem?), mas não vou entrar por aí agora, porque seria outra conversa, demasiado longa.

    2 - Arquitectura por acaso tem praxe desde há uns anos; não sei se tem dux, mas é natural que sim. Mas mesmo que não tenha, e Belas Artes não tem, eu não veria problema em não incluir duas faculdades por não terem duxes (mas concordo que se deveria então tentar ter outro tipo de representação dessas faculdades).

    3 - Problema sério, vejo em o "Magnum" impor provas de entrada a duxes escolhidos pelos seus conselhos de veteranos! Não sei se ainda o fazem, mas faziam nos anos 90, e isso é inadmissível. Se um CV escolhe um dux (e se a escolha é legítima, nomeadamente se este é estudante e veterano), este pertence ao MCV. Ponto.

    4 - Também é inadmissível não aceitarem mulheres! É um conselho de veteranos ou o clube do Bolinha? A Faculdade de Ciências teve uma dux durante vários anos e por causa disso perdeu a representação no "Magnum"; no contexto, não perdemos grande coisa. (Na verdade, ganhámos liberdade face aos disparates que de lá emanavam.)

    5 - O Código da Praxe de Coimbra, o original, é um mau texto (bastaria ver que o artigo 1.º, que dá uma definição de Praxe que abrange todos os usos e costumes académicos, é contradito pelo resto do código, que regulamenta quase só a "praxe de praxar") que na sua época não foi bem aceite por alguns meios ligados às tradições académicas em Coimbra. O chamado "Projecto de Código da Praxe do Porto" é uma cópia mal-alinhavada desse mau texto (uma cópia que ignora aspectos tão fundamentais como o facto de as trupes serem um conceito estranho à praxe portuense e que onde se afasta da cópia pura introduz asneiras monumentais como o "casaco preto" e a capa à futrica para os veteranos; até erros nas cores dos cursos tem).

    6 - O OUP é um organismo artístico, mas é também um organismo académico (ao contrário dos Serviços Sociais!) e tem, ou teve, praxe. Teve, aliás, um Conselho de Veteranos (o primeiro que houve no Porto!) no tempo do grande Flávio Serzedello. Não me repugnaria que estivesse representado no Magno Conselho de Veteranos (ou Conselho Máximo de Veteranos, se quiseres...). Mas estou a pensar num MCV em condições. No "Magnum" que vai existindo, bem, não desejo tal mal ao OUP.

    Um abraço,
    João

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  11. Bem, é melhor esclarecer o último ponto: o OUP tem (ou teve?) uma praxe própria, com uma hierarquia própria; uma hipotética representação no MCV (num MCV em condições, repito) seria necessariamente a um título diferente do das faculdades (consultivo?); e nunca como mais uma "casa" (para usar um termo moderno de que não gosto) - até porque, se há crítica que no meu tempo era feita com razão ao OUP, era a de se isolar demasiado; muitos orfeonistas mal conheciam a vida académica da faculdade onde estavam matriculados.

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  12. Caro João:

    a "praxe" e a hierarquia internas do OUP não são propriamente compatíveis com a praxe e a hierarquia académicas. Isto é, um veterano "cá fora" será caloiro no OUP no primeiro ano que se inscrever. Chegará a veterano no OUP quando atingir a quinta inscrição - podendo, no entanto, ser um simples quintanista de Medicina.

    «In rebus praxis» isto não conta - nem tem de contar.

    Quanto ao «isolacionismo» do OUP, pode até ser verdade - postura que eu próprio critiquei internamente. No entanto, se alguns elementos do OUP "mal conheciam a vida académica" das suas faculdades, isso pode ser entendido como a expressão da gratificação que sentiam na vivência praxística orfeónica, que não encontravam porventura nas suas faculdades.

    Conheço casos bizarros de orfeonistas que se declararam anti-praxe nas respectivas faculdades, mas que envergaram com todo o orgulho e garbo o traje académico durante todo o tempo que estiveram no OUP. Isto também quererá dizer alguma coisa.

    O OUP, caro João, não é nem nunca foi um organismo praxístico - pelo menos não no sentido que a Matilha quis dar a "Praxe". Se foi/é um organismo defensor das tradições académicas? Sem dúvida. Mas a partir do momento em que se percebeu que a Matilha queria estender as garras a tudo o que usa traje académico e mexe... mais devagar. Naturalmente, as tradições do OUP reflectem a vivência académica dos seus componentes, mas rege-se com absoluta autonomia pelos seus Estatutos e pelo seu próprio código de valores.

    Se o conselho máximo de veteranos (uso a denominação que lhe é dada no «código») tivesse um comportamento credível e uma postura ponderada, veria com bons olhos que o OUP e outros organismos artísticos assistissem aos trabalhos, a título consultivo ou com o estatuto de observador. No actual estado e coisas, o OUP "receia" e com todas as razões a possibilidade de o CMV querer que as suas deliberações sejam vinculativas para a instituição. Enquanto unidade orgânica da Reitoria da UP, tal ingerência é inadmissível.

    Que o OUP deva manter o melhor relacionamento institucional com o CMV ou qualquer outro organismo, acho normal, saudável e desejável. Infelizmente, face à tentação totalitária, tal não tem sido possível. Esperemos que num futuro desejavelmente próximo se possa chegar a algum tipo de entendimento com esses sujeitos. De momento, as relações estão cortadas. Esperemos que a situação se modifique.

    Que fique claro a quem ler estas intervenções: EU NÃO FALO EM NOME DO OUP. As posições que aqui assumo são puramente individuais e NÃO podem nem devem ser confundidas com as posições oficiais da instituição.

    Nos pontos 1, 3, 4 e 5 estamos perfeitamente de acordo. Desconhecia a existência de 2. Ainda bem que assim é.

    Aquele abraço, ilustre João.

    Eduardo

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